terça-feira, 7 de julho de 2015

O romantismo está morto


Houve um tempo em que eu acreditava no amor, mais do que isso, eu acreditava no romantismo. E sonhava, boba, com aqueles momentos que nos fazem saber amadas. Acreditava em declarações verdadeiras, em flores nos momentos especiais, em andar de mãos dadas pelas ruas e em bilhetinhos de amor perdidos nos meios dos livros.
Houve um tempo em que eu assistia filmes românticos e acreditava que as pessoas poderiam fazer pedidos de casamento, noivado, namoro, de formas planejadas e memoráveis. Acreditava nos textos de amor e imaginava que sempre havia alguém por trás motivando todas aquelas linhas.
Houve um tempo em que eu acreditava nas pessoas. Na vontade de fazer o bem, em agradar quem se ama, em querer fazer o outro feliz sem receber nada em troca além do sorriso sincero. Houve um tempo em que eu acreditava que as pessoas abraçavam, beijavam e viviam juntos apenas por afinidade, por vontade própria, por amor e não por esperar algum “benefício” com isso.
Houve um tempo em que eu acreditei em muitas coisas. Mas a vida nos abre os olhos e endurece o coração. Hoje eu não vejo mais romantismo em canto algum. As pessoas são rudes, grosseiras e egoístas. Sempre ocupadas com o seu mundo particular, com as suas vontades, com as suas agendas lotadas. Não há espaço para mais ninguém, estão todos muito ocupados consigo mesmo que são incapazes de olhar para o próximo. A compaixão está morta, o amor está morto, o romantismo está acabado. Somos seres solitários presos em nossas próprias angústias, incapazes de sentir felicidade com a alegria de alguém que queremos bem.
A vida é curta, dizem, não se pode desperdiçar com mais ninguém. A vida é muito curta para os bilhetinhos de amor, para as flores, para as ligações, para os pequenos poemas mal feitos. A vida é muito curta para se fazer alguém feliz. A vida é tão curta e passageira que sua efemeridade nos tornou escravos de nós mesmos: somente a nossa dor é profunda, somente nossos problemas são grandes, somente nós somos importantes. Ninguém parece querer repartir a vida e os sentimentos, os abraços, os momentos bons e ruins. Ninguém se socializa, ninguém se abraça, ninguém se beija, de verdade. Os relacionamentos são instantâneos e a solidão é eterna. Somos todos solitários. Solitários conectados. Solitários plugados. Solitários mesquinhos e rancorosos que não sabem dar e nem demonstrar amor. Solitários amargos, que vivem rápido, porque a vida é curta e vazia

segunda-feira, 6 de julho de 2015

SOCORRO TARDIO



    Você já parou para pensar, algum dia, a respeito da caridade? 

    De um modo geral, confundida com a esmola pura e simples, o dar para se ver livre do pobre, do pedinte, dar para que ele se vá, de uma vez. 

    Face aos problemas da fome, da miséria, já não lhe ocorreu dizer: Isto é um problema do governo? Será mesmo? 

    Afinal, quem, em que hora, quando e em que lugar deve praticar a caridade? 

    Certa vez, no tempo dos czares, no Teatro de Moscou, foi representada uma peça muito célebre.

    Todas as dependências estavam totalmente tomadas pelos membros da realeza. 

    O enredo girava em torno dos sofrimentos de um soberano místico que, em meio a cruéis padecimentos, sacrificou-se pela fé cristã. 

    A música enlevava os corações da nobreza assistente. Todos se identificavam com as agonias cristãs da personagem que, de alguma forma, traduzia um pouco do íntimo de cada um. 

    Quando findou o colorido espetáculo, à saída do Teatro, deitado sob a marquise, estava um mendigo. 

     Tiritava de frio. Parecia que delirava em meio à nevasca da noite.

    Uma das damas da corte, ao descer as escadarias que a levariam à sua carruagem, movida por um natural impulso de bondade, retirou o rico casaco de peles que a agasalhava, e se encaminhou em direção ao pobre homem, com a firme intenção de o cobrir. 

    A dama que lhe fazia companhia, porém, percebendo o que a outra iria fazer, a deteve. 

    Não faças isso!

    De que adiantaria a esse miserável uma peça de vestuário de tal valor? Amanhã enviarás, por um dos teus servos, agasalhos quentes para ele.

    A dama do casaco de alto preço, movida agora por sentido utilitarista da vida, respondeu: Sim, tens razão.  E tornou a vestir o casaco, buscando a carruagem. 

    Chegaram ao luxuoso castelo, tomaram um chá quente e reconfortante e buscaram as camas aconchegantes. 

    Esqueceram da agonia do desconhecido tombado sob a marquise gélida. 

    No dia seguinte, despertando já manhã alta, a dama recordou-se do homem tiritante de frio. 

    Chamou um de seus servos e ordenou que levasse agasalhos ao pobre homem.

    Quando lá chegou, o serviçal se deparou com o desconhecido já morto, sendo removido pela polícia.

* * *
    O fato responde aos questionamentos iniciais. 

    Sempre que a caridade recebe a interferência de polêmicas, discussão, debate, invariavelmente o socorro chega atrasado. 

    É necessário que cada um de nós faça o bem hoje. Há muitas formas de se praticar a caridade: 

    Retirar alguém da escuridão do analfabetismo. Providenciar internamento devido a um doente sem recursos. 

    Levar o remédio necessário ao que se encontra no leito. Propiciar o leite a uma criança cuja mãe já apresenta os seios vazios. 

    Ofertar um brinquedo ao menino de rua, ao garoto sem pais, à criança que espera.

    Enfim, ser caridoso é fazer aos outros o que desejamos que os outros nos façam, tanto no aspecto material como no moral.

* * *
    As nossas posses de nada valerão se não tivermos no cofre do coração o pão da caridade e a palavra consoladora da misericórdia que nos compete distribuir. 

    Dar do que nos sobra é dever de solidariedade, dar um tanto mais é doação plena.

Revolução dos Cravos