segunda-feira, 26 de novembro de 2012

A Árvore da Maldição

Um dos mestres do horror e da agonia, William Friedkin, diretor mais conhecido pelo filme “O Exorcista”, lançou “A Árvore da Maldição” (The Guardian) em 1990. No longa, Camilla, uma mulher com sotaque britânico, trabalha como babá em casas de família e as conquista com seu talento, simpatia e organização. Porém, seu real objetivo é raptar bebês e levar seu sangue novo para alimentar uma árvore macabra.
Sem contar com muitos recursos tecnológicos, Friedkin poderia cair em um abismo e lançar um filme B pastelão da pior qualidade. Porém, o diretor escapou dessa possibilidade com sua maneira peculiar de olhar para o horror, indo além da esfera material, na qual o visível já é o terror em si. Friedkin explora os fatores psicológicos, vai além da manipulação de situações para que acabem em berros, sustos ou desespero. Seu poder está nos detalhes, no adiamento do grito, como se cada objeto, som, ou diálogo pudesse causar uma destas reações.
Um desses joguetes é um pequeno livro, peça chave do filme e constantemente aberto pela mão de alguns personagens. É um livreto infantil, destes que montam figuras tridimensionais quando folheados. A cada página, cria a imagem de uma árvore obscura que ilustra um conto de fadas. O contraste entre a obra inocente que, de súbito, faz nascer uma forma macabra, monta um clima de mistério e aumenta a tensão e estranhamento em quem assiste.
Essa maneira terrorista de insinuar o terror também é vista logo na primeira cena, quando uma família desconhecida prepara as malas para viajar. Na casa, há alguém cuidando das crianças, um alguém sem rosto, que somente aparece na penumbra, levanta-se do sofá, coloca uma chupeta na boca da criança, manifesta-se como uma força ruim e sobrenatural entre os cômodos da casa.
O sobrenatural, aliás, é demonstrado de uma forma sutil. O mal, encarnado na babá estrangeira e na árvore, estende sua aura para todos os personagens do filme e encontra um casal de yuppies  americanos que tenta começar a vida em uma nova cidade. A relação dos dois, de início morna e de grandes expectativas, ganha tons mais vivos quando procuram os serviços da estranha babá Camilla.
O que seria uma solução para os dois, acaba tornando-se mais um tormento. A esposa logo se apega pela moça loira de sotaque inglês, mas o marido sempre observa-a de forma desconfiada. No início, o problema do rapaz é apenas certa sensualidade da moça, que mexe com ele, mas, depois, ele percebe certas atitudes suspeitas e começa investigá-la. Para piorar, sonhos estranhos perturbam suas noites, impedindo-o de trabalhar e, além disso, um de seus amigos interessa-se pela babá.
Em “A Árvore da Maldição”, assim como em outro filme do diretor, “Possuídos” (Bug, de 2006), há certo interesse em mostrar o processo de destruição do casal utilizando fatores externos e sobrenaturais. No caso de “Bug”, são insetos invisíveis que atormentam uma mulher e seu namorado, deixando-os à beira da loucura. Assim como no desgaste de qualquer relacionamento, em que não se sabe para onde correr e nem o que realmente está acontecendo, o fantástico e o maldito perseguem os casais de Friedkin em ambos os filmes, acuando-os em universos psicóticos, mas, ao mesmo tempo, tornando-os mais interessantes e fortes.
Personagem principal, a babysitter demonstra uma desconexão completa com a realidade, seus trejeitos revelam um tom fantasmagórico. Utilizada como um fantoche da árvore maldita, ela caminha sozinha por trilhas e sofre com o assédio dos homens. É a natureza, que subjuga Camilla em favor de seus interesses, mas, ao mesmo tempo, protege-a de perigos reais: a polícia, o emprego e os homens que tentam abusar de seu corpo.
O rapto dos bebês ocorre sempre durante a noite, quando a árvore domina até mesmo os lobos, fazendo-os escoltarem o caminho da mulher. Ela se aproxima e entrega seu corpo para as raízes, tronco e nervos da árvore. Enquanto sua pele mescla-se com as cascas e folhas do vegetal, Camilla promete-lhe mais um filho. Um presente ao único ser com quem tem uma conexão de verdade.

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